Quando se pensa em um lugar ideal para viver, o que vem à cabeça? Segurança, lazer e uma bela paisagem? Vizinhos felizes, ruas arborizadas, quintais floridos, crianças brincando na frente das casas, pessoas fazendo caminhada e fachadas que nos lembram casas de bonecas? Este lugar existe, não só um, mais vários, tendo como essência o New Urbanism, que se impôs através de incessantes e consistentes trabalhos de importantes instituições, ligadas ao planejamento de cidades, e de vários planos diretores e novas regulamentações urbanísticas, virando moda entre os profissionais ligados a esta área.
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Casas em Kingston. |
Com o intuito de repensar os subúrbios, dominantes no cenário norte-americano desde os anos 50, o New Urbanism, propõe algumas soluções, que no norte são chamadas de radicais, como: aumento de densidade populacional, em relação aos subúrbios; incentivo ao uso múltiplo (como por exemplo, comércio e residência na mesma quadra); zoneamento flexível permitindo que alguns dos percursos diários sejam feitos a pé e volta do grid de ruas em substituição aos cul-de-sac. Fernando Lara (2001) em “Admirável Urbanismo Novo”, afirma que “entre os argumentos mais convincentes está o fato de que o aumento de densidade salva áreas cultivadas e reservas naturais da ameaça do modelo suburbano, e também agrada a indústria da construção que vende mais unidades em menor espaço”.
Mesmo com argumentos que descrevem um lugar perfeito para se viver, o New Urbanism apresenta vários pontos fracos, como: não oferece solução alguma para os problemas já existentes (os conceitos são aplicados apenas em novos empreendimentos, não a áreas já ocupadas); deixa de fora os que mais sofrem de problemas urbanos (nos EUA, os negros e os imigrantes); o conservadorismo estético dos empreendimentos, onde casinhas vitorianas com telhado de duas águas, revestimento de madeira e varanda frontal dominam esta “receita” de planejar cidades.
Um famoso exemplo deste novo urbanismo, é a cidade Celebration da Disney, onde tudo foi cuidadosamente planejado, projetado e executado para a satisfação dos moradores, de viver em um lugar perfeito. Rosa Moura (1998) nos conta no texto “A Cidade Vigiada”, que “na arte de planejar, organizar, gerir, produz espaços que moldam moradores sob interesse de um grande irmão. Verdadeiros cenários que aprisionam e sintetizam a realidade”.
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Vizinhança em Celebration. |
Além da Disney Corporation planejar o cenário, ela também resolve criar o script de todos os personagens, neste caso moradores. Celebration não tem nenhuma forma de organização politico-democrática, como prefeitura por exemplo. “Um administrador, funcionário da Disney nomeado para tanto, exerce as funções de autoridade administrativa, legislativa e, se deixarem, judiciária também” (LARA, 2001).
Até os cidadãos de classe média alta americana, profissionais liberais qualificados que poderiam morar em qualquer outro ponto do país ou do mundo, resolvem investir caro para morar em Celebration. Fernando Lara (2001) afirma que uma possível resposta para esta questão seria um apoio “na falência do modelo de subúrbio americano, que do sonho dourado dos baby-boomers (geração que nasceu entre 1946 e 1954, crescendo em frente a tv) recém casados na década de 60 e 70, passou a pesadelo, em meados de 30 anos”.
Lineu Castello, no texto “Meu Tio era um Blade Hunner: ascensão e queda da arquitetura moderna no cinema”, afirma que “em The Truman show o cenário é uma representação da realidade e a realidade é uma representação da irrealidade cenográfica”(CASTELLO, 2002). Nada mais explicativo para um projeto que se baseia em um ideal distante de uma cidade perfeita, e por que não se dizer utópico, a partir do momento em que se faz uma receita mágica de urbanismo, e esta, executada em diversos lugares, não correspondendo a realidade da sociedade atual.
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Colunista de Arquitetura
Ipatinga, 11 de março de 2013
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